domingo, 12 de junho de 2011

Rotami


Não sei se eram cinco ou seis da tarde. Algum horário em que o sol não está muito bem decidido.
Nem decisão do sol, nem decisão do tempo. Era úmido, mas também seco. Algum coisa entre vermelho e noite. Eu estava no telhado e via aquele menino pobre dizendo que não tinha onde dormir nem o que comer. Eu sabia que não tinha pais, ou se tinha, não os pertencia. Era do mundo. Surgiu do telhado não sei como. Estava ali e permaneceria ali, sem teto e sem comida. Me pedia algo e eu sabia que não poderia lhe dar migalhas. Também, tanto fazia: se lhe desse muito, em pouco ficaria com fome de novo. Se lhe desse pouco, eu mesma me sentiria constrangida. Minha mãe, de alguma forma, me induzia a fazer a minha parte como ela bem achava que pobres deveriam ser tratados, enquanto também me induzia a me comportar como deveriam se comportar os bons: faça a sua parte apenas, permaneça na sua e eu permaneço na minha! Cada um cumprindo um papel. Mas eu sabia que não era assim tão simples. De alguma forma eu decidia que precisava dar mais àquele garoto, pensava: se me reprovarem, não importa, eu durmo aqui, no telhado. Parecia que eu também não pertencia mais a lugar nenhum. O céu era o meu teto, o teto era o meu chão.

Em seguida descia o telhado até chegar a um jardim com pequenas pedras sobre um gramado. Atravessava a varanda úmida, já era noite, e dentro da casa uma festa se acabava. Poucos convidados entorpecidos dançavam. Fim de festa, fim de vida, cansaço. Atravessa a sala até o portão da casa, onde sabia que umas garotas me esperavam. Eu não as conhecia, como não conhecia aquela casa que invadia. Não conhecia as pessoas, não sabia o porquê da festa, da música estranha, o chão sujo, mas ia até o portão encontrar as garotas.

Alguém me abraçava e uma das meninas estava sentada. Me sentava ao lado dela e me sentia bem, ficávamos bem próximas e ninguém dizia nada, mas por alguma razão eu sabia que era ali que deveria ficar: um portão pequeno, de onde dava para ver a rua escura e vazia, um vento úmido, o cheiro da grama fria, umas garotas falando besteira ao eco da rua... Eu olhava para o lado e observava a orelha da garota sentada, gostava dos brincos que ela usava. Tinha os cabelos pretos, uma pele clara, e dentro da orelha, um pedaço de macarrão! Deixava estar...